Todo estudante das Escrituras
percebe que o Antigo Testamento destaca-se, mesmo como uma questão cultural[1], na prática de ofertas e sacrifícios[2], que são uma constante. Nas questões
relativas ao pecado era, dentre outras, função do sacerdote[3] interceder a Deus pelo povo e
consequentemente também por si mesmo. Vimos que a relação de Deus com o homem
era exercida (em maior parte) através dos profetas. Porém, a representação do
povo para com Deus era possível apenas mediante a atuação dos sacerdotes e do
sumo sacerdote.
Enquanto os profetas são
predominantemente os porta-vozes de Deus e aplicam a palavra de Deus na
situação dos seus contemporâneos, os sacerdotes são aqueles cujo a função
principal é a de interceder por outros seres humanos na presença de Deus. De
forma simples, se o profeta é o representante de Deus diante da humanidade, o
sacerdote é o representante da humanidade diante de Deus (LETHAM, 2007, p.
103).
Os sacerdotes foram constituídos
por Deus. Andrade nos mostra que “no Antigo Testamento, era o ministro
divinamente designado, cuja principal função era representar o homem diante de
Deus” (2007, p. 324). Em harmonia com esse autor, mas explorando as demais
funções exclusivas dos sacerdotes, outro escritor destaca: [...] um sacerdote
é: (1.) Um homem devidamente designado para agir em prol de outros homens nas
coisas concernentes a Deus. A idéia que jaz no fundamento do ofício é que os
homens, sendo pecadores, não têm livre acesso a Deus, portanto, deve-se
designar alguém que tenha em si mesmo esse direito, ou que se haja concedido,
para que se aproxime de Deus em favor deles. Conseqüentemente, um sacerdote é,
pela natureza de seu ofício, um mediador. (2.) Um sacerdote é designado para
oferecer dons e sacrifícios pelos pecadores. Sua função é reconciliar os homens
com Deus; fazer expiação pelos pecados deles; e apresentar suas pessoas,
confissões e oferendas a Deus. (3.) Ele intercede pelo povo. Isso não meramente
como um homem pode orar por outro, mas recomendando a eficácia de seu
sacrifício e autoridade de seu ofício com base sobre as quais suas orações
devem ser respondidas (HODGE, 2001, p. 830).
Fica claramente exposto nas
citações acima que os sacerdotes, mesmo não sendo perfeitos, obtinham em si
responsabilidades que parecem ser inigualáveis. Nessa ótica, são diversos os
sinônimos para esses homens privilegiados[4]. Dentre eles, podemos destacar o de ser
mediador entre Deus e os homens. É tão sublime que soa como uma idéia
paradoxal.
Corroborando esse pensamento, outro
autor argumenta: A passagem clássica na qual são dadas
as verdadeiras características do sacerdote e na qual sua obra é em parte
designada, é Hb 5.1. Estão indicados ali os seguintes elementos: (a) o
sacerdote é tomado dentre os homens para ser seu representante; (b) é
constituído por Deus [...]; (c) age no interesse dos homens nas coisas
pertencentes a Deus, isto é, nas coisas religiosas; (d) sua obra especial
consiste em oferecer dádivas e sacrifícios pelos homens. Mas a
obra dos sacerdotes incluía ainda mais que isso. Ele também fazia intercessão
pelo povo (Hb 7.25) e os abençoava em nome de Deus, Lv 9.22 (BERKHOF, 2004, p.
331, grifo do autor).
Uma vez sabedores das
características principais e secundárias dos sacerdotes como também de sua
importância no bem viver social-espiritual humano, com relação a Deus,
resta-nos saber como se procedeu, de fato, a instituição sacerdotal
estabelecida por Deus.
[1] Deus colocou o sistema sacrificial no
cerne da vida nacional judaica. Quaisquer que fossem suas aplicações e
implicações imediatas para os judeus, o sacrifício perpétuo de animais e o
arder perpétuo do fogo dos altares por certo existiam, segundo o designo de
Deus, para gravar na consciência do povo de Israel a percepção de que eles eram
profundamente pecaminosos. Além disso, serviram durante mais de mil anos, como
figura que prenunciava o sacrifício de Cristo na cruz, ainda no futuro (HALLEY,
2001, p. 127).
[2] Soares diz que o sacrifício é o tema
central do Antigo Testamento. Isso salta à vista de qualquer leitor assíduo da
Bíblia. Essa prática, segundo ele, é tão antiga quanto a humanidade (Gn 4.4;
8.20) (2008, p. 113).
[3] A palavra hebraica para sacerdote
é kõhen, “autoridade principal ou oficial mor, sacerdote” (HARRIS;
ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 704, apud SOARES, 2008, p. 112). Vine diz que
esta palavra é achada 741 vezes no Antigo Testamento (2004, p. 271). O termo kõhen era
usado para se referir não só ao sacerdócio hebraico, mas aos “sacerdotes”
egípcios (Gn 41.50; 46.20; 47.26), aos “sacerdotes” filisteus (1Sm 6.2), aos
“sacerdotes” de Dagom (1Sm 5.5), aos “sacerdotes” de Baal (2Rs 10.19), aos
“sacerdotes” de Quemós (Jr 48.7), e aos “sacerdote de Baalins e de Aserá (2Cr
34.4,5). O oficio sacerdotal judaico foi estabelecido pelo Senhor nos dias de
Moisés. Mas antes da instituição do sumo sacerdócio e do ofício sacerdotal,
lemos do sacerdócio de Melquisedeque (Gn 14.18) e dos “sacerdotes” midianitas
(Êx 2.16; 3.1; 18.1). Em Êx 19.24, são mencionados outros “sacerdotes”: pode
ser que eram “sacerdotes” midianitas” ou “sacerdotes” de Israel antes do
estabelecimento oficial do sacerdócio levítico (VINE, 2004, p. 272).
[4] Privilegiados no sentido de
constituídos por Deus para tal ofício.
Artigo extraído
de: RODRIGUES, André. O Tríplice Ofício de Cristo: Profeta,
Sacerdote e Rei. 2011, Editora Nossa Livraria - PE
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