Diversos
teólogos dedicaram suas pesquisas na área da Teologia Sistemática[1].
Nomes como: Charles Hodge, A. A. Hodge, Louis Berkhof, Wayne Gruden, Augustus
Hopkins Strong[2],
Myer Pearlman, Charles Cadwell Ryrie, Stanley Horton, Charles Finney, Jonh
Teodore Mueller, Emery H. Bancroft, Henry Clarence Thiessen, e alguns dos
expoentes nacionais tais como Esequias Soares, Severino Pedro da Silva,
Zacarias Severa, entre outros, dispõem para nós informações essenciais quanto
às doutrinas estabelecidas inerentemente nas Escrituras. Entretanto, muitos dos
que se aplicam a esses estudos parecem negligenciar na defesa da Cristologia
quando se trata da Doutrina dos Ofícios exercidos pelo Senhor Jesus Cristo, o Munus
Triplex[3].
Essa doutrina, parte integrante da Cristologia, traz informações sobre o
desenvolvimento do Tríplice Ofício exercido por Ele e reflete todos os aspectos
de Sua atuação como Profeta, Sacerdote e Rei, tanto no aspecto
exegético-histórico (fundamentado na revelação do Antigo Testamento) quanto no
aspecto doutrinário (fundamentado na revelação do Novo Testamento).
Dos vários
estudiosos que tratam de sistematizar as doutrinas bíblicas, poucos se preocupam
em se esmerar nesse tema como deveriam, tratando a matéria, não raro, com
simplicidade e pouca relevância. Muitos outros temas da Cristologia[4] são
por demais esclarecidos, como a doutrina do Nascimento Virginal, da Encarnação,
das Duas Naturezas, da Sua Impecabilidade etc. Todos esses temas têm sua devida
importância. Contudo, o estudo acurado[5] dos
Ofícios traz-nos um retrato de um Jesus revestido de uma autoridade sui
generis[6].
É triste não poder observar em alguns expoentes do texto bíblico o cuidado em
sistematizar pormenorizadamente a relação entre os três principais encargos
veterotestamentários e sua aplicação ímpar e superior na vida e pessoa de
Jesus.
O “cargo”,
“função” e/ou “ocupação”[7] de
Jesus declara-nos um serviço[8] dado
para os homens como dádiva preciosa, ou seja, a imensurável graça de Deus. Já o
sentido próprio “triplo ou tríplice”[9],
dá-nos a ideia de revestimento, segurança diferenciada, constituída com mais
gênero do que o comum, ou seja, algo estritamente particular[10].
Dessa forma, entendemos que somente em Jesus foi manifesta essa excepcional
capacidade. Ele tornou-se O Cristo, O Ungido por excelência, capacitado para
Despenseiro Maior das Palavras do Pai, dentre todos os ecônomos (Profeta);
consciente de se tornar O Perfeito Sacrifício, Santo e sem máculas, em favor da
perdida humanidade (Sacerdote); e, por último, preparado para assumir a
completa identidade de Absoluto Rei dos Reis e Senhor dos Senhores (Rei)[11].
Essas foram
as distintas qualidades que provavelmente estimularam Sua vinda a este
mundo. Não que Ele as necessitasse, mas para tornar possível, através delas,
aplicar novamente a ideia original do Pai[12] na
coroa da criação, que é o homem.
Assim nos
diz as Escrituras:
Então, foram
abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; e
coseram folhas de figueira, e fizeram para si aventais. E ouviram a voz do
SENHOR Deus, que passeava no jardim pela viração do dia; e escondeu-se Adão e
sua mulher da presença do SENHOR Deus, entre as árvores do jardim. E chamou o
SENHOR Deus a adão e disse-lhe: Onde estás? E ele disse : Ouvi a tua voz soar
no jardim, e temi, porque estava nu, e escondi-me. [...] E a Adão disse:
Porquanto deste ouvidos à de tua mulher e comeste da árvore de que te ordenei,
dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com
dor comerás dela todos os dias da tua vida. Espinhos e cardos[13] também
te produzirá; e comerás a erva do campo. No suor do teu rosto, comerás o teu
pão, até que te tornes à terra; por que dela foste tomado, porquanto és pó e em
pó te tornarás. [...] E fez o SENHOR Deus a Adão e a sua mulher túnicas de
peles[14] e
os vestiu. [...] O SENHOR Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden, para
lavrar a terra, de que fora tomado (Gn 3.7-10; 17-19; 21; 23; ARC).
Antes da
queda, Deus cria o homem, coloca-o em um jardim e lhe permite comer de tudo,
exceto da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gn 2.16,17). Esse é o
primeiro mandamento proibitivo, ou seja, a ministração da Palavra pelo
próprio Deus. Depois o homem erra o alvo e cai (Cap. 3), introduzindo, assim, o
pecado no mundo. Percebeu que estava nu. Entretanto, Deus provê veste de
pele de animal para ele. Aqui temos o registro do primeiro sacrifício.
Por último, Deus estabelece preceitos mais contundentes para reger
o homem decaído da graça. Em outras palavras, Ele deixa de ser Aquele
que o visitava na viração da tarde, para ser estritamente seu Senhor.
Foi exatamente isso que fez Jesus com a humanidade perdida: como Profeta,
ministrou-lhe a Palavra do Pai; como Sacerdote, morreu por nós, para nos livrar
da condenação advinda do pecado; e como Rei, estabeleceu normas e parâmetros
para nossa vida, para que não nos tornemos mais uma vez escravos deliberados do
pecado, convidando-nos a O seguir até o fim. Se não fosse assim, de nada
valeria Seu sacrifício. Dessa forma, Ele buscou resgatar aquele projeto do
Plano Original de Deus.
Qual seria,
então, a explicação para a falta de atenção dos expoentes teológicos a esse
assunto tão valioso? Por que os tratados de Teologia Sistemática preocupam-se
somente em definir questões referentes aos temas supracitados em detrimento
dessa doutrina? É bem verdade que existem prioridades, contudo a Doutrina do
Tríplice Ofício precisa ser explorada, comentada, revista e, principalmente,
aplicada, não em sentido literal, é claro, mas a título de conscientização de
que essas funções exercidas por Cristo estão intimamente ligadas a nossa
condição espiritual atual. Ademais, Cristo faz parte de nossa vida,
consequentemente, também esses Ofícios devem fazer. Somos herdeiros das
promessas, porque Ele nos relatou tais promessas; somos salvos, porque Ele nos
salvou e nos mantém em intercessão junto ao Pai; entendemos Seu Senhorio e
Poder, porque O reconhecemos mediante Suas palavras, obras e legado.
Artigo extraído de: RODRIGUES, André. O Tríplice Ofício de Cristo: Profeta,
Sacerdote e Rei. 2011, Editora Nossa Livraria - PE
[1] A Teologia
Sistemática consiste em organizar pormenorizadamente as principais doutrinas,
alicerçadas nas Escrituras. Andrade (2007, p. 343) diz que se trata da
organização lógica e ordenada das verdades alusivas a Deus e ao seu
relacionamento com o homem, num sistema doutrinário, cultural e historicamente
coeso e harmônico com as escrituras do Antigo e do Novo Testamento. A Teologia
Sistemática é conhecida também como dogmática.
[4] [Do gr. christhos,
ungido + logia, estudo] Estudo sistemático e ordenado que tem como
objeto a vida e a obra de Cristo [...], levando-se em conta a harmonia e
a unidade do Antigo e do Novo Testamento (ANDRADE, 2007, p. 123).
[6] [Lat., 'de seu próprio
gênero'.] Que não apresenta analogia com nenhuma outra (pessoa ou coisa);
peculiar (AURÉLIO).
[11] Cf.,
respectivamente para cada seção apresentada: primeiro Lc 2.25-32, 49; Jo
4.31-34; Hb 1.1; segundo Mt 1.21; IICo 5.21; Gl 1.4; Hb 10.26; IPe 3.18; e por
último Mt 2.2; Lc 19.38; 23.3; Jo 1.49; 19.14, 19-22; ITm 1.15-17; Ap 19.16.
[14] A fim de
ocultar sua nudez, o homem preparou inadequadas vestes de folha de figueira,
símbolo de boas obras. Em contraste com isso, Deus produziu
vestimentas substanciais, feitas de pele de animais. O sacrifício de alguns
animais foi necessário para essa provisão. Para os intérpretes cristãos, isso
significa a provisão por meio de Cristo, em face de Sua obra expiatória, além
da retidão que Ele oferece como resultado de Sua obra (Rom.
3.21-26). As vestimentas recebidas por Adão e Eva foram-lhes supridas divinamente.
Agora estavam de novo aptos a estar na presença de Deus (CHAMPLIN, 2001, Vol.
1, p. 38, grifos do autor).
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