Uma
vez definida a diferença das aplicações dos termos Cristo e Messias, e estando
cientes de que ambas as palavras significam Ungido nos diferentes idiomas, convém
apenas mostrar a importância atribuída à unção nos principais ofícios
veterotestamentários, bem como nos objetos sagrados usados no serviço cultual para
Deus. Sabemos que o Antigo Testamento apenas apontava para um futuro no qual os
fatos seriam perfeitamente concretizados. Sendo assim, vamos analisar os variados
aspectos da unção relacionados à pessoa de Jesus, principalmente o referente ao
Seu ministério messiânico.
O derramamento
ou simplesmente a aspersão do azeite sobre uma pessoa ou objeto era um costume
muito antigo nas práticas de diversas culturas. Fora de Israel, por exemplo,
diz Champlim que: “[...] o azeite, uma substância empregada na cozinha, na
iluminação, nas lavagens [...], na medicina ou na cosmetologia, também era e
continua sendo empregado nos ritos religiosos” (1995, vol. 4, p. 241). É
curioso notar que há uma diversidade de usos importantes do azeite e uma
estreita relação com a religiosidade neles. Champlin destaca ainda a
importância do azeite:
[...] Talvez a sua associação às curas tem
sido o grande motivo que levou o azeite a ser usado nas unções dos enfermos. O
Dicionário Clássico de Oxford informa-nos que o uso cúltico do azeite é uma das
mais antigas práticas de que os homens têm notícia.
Sabe-se que as estátuas dos deuses eram ungidas
no Egito, na Babilônia, em Roma e em outros países da antiguidade. O azeite era
usado nas purificações rituais. [...] Talvez a unção fosse praticada no caso
dos reis por que esse ofício era mesclado com o do sacerdócio, perfazendo assim
uma espécie de sinal divino das funções reais, tendo em vista interesses tanto
políticos quanto religiosos. O uso da unção, quando da consagração dos
sacerdotes, era uma prática comum em muitas das culturas antigas (IBIDEM).
Do ponto de vista de Halley, “a unção era
comum no antigo Oriente Médio; envolvia a aplicação de azeite a uma pessoa (ou,
ocasionalmente, a um objeto)”, (2001, p. 394). Neste último caso, Halley
discorda com os expoentes supracitados. Porém, traz informação de que havia
três importantes aplicações de unção no Antigo Testamento: a comum, a medicinal
e a sagrada[1].
As definições literais são as seguintes:
A unção comum
com óleos aromáticos (Rt 3.3; Sl 104.15; Pv 27.9). Era suspensa em períodos de
luto (2Sm 14.2; Dn 10.3; Mt 6.17). Os visitantes eram ungidos como sinal de
respeito (Sl 23.5; Lc 7.46). Pela unção, os mortos eram preparados para o
sepultamento (Mc 14.8; 16.1).
A unção médica
– não necessariamente com azeite – era costumeira para enfermos e feridos (Is
1.6; Lc 10.34). Os discípulos de Jesus ungiam com azeite (Mc 6.13; Tg 5.14).
O
propósito da unção sagrada era
dedicar a Deus um objeto ou pessoa. Dessa maneira, foram ungidos a pedra que
Jacó usou como travesseiro em Betel (Gn 28.18) e o Tabernáculo com seus móveis
(Êx 30. 22-29) (IBIDEM, grifos do autor).
Os
autores acima mostraram a importância da unção no contexto geral (com exceção
do terceiro parágrafo da última citação). A palavra que é usada nesse sentido
secular, de acordo com Vine, é “mishah”,
ou seja, “unção”. De modo que:
Este
substantivo ocorre 21 vezes e só em Êxodo, Levítico e Números. Sempre acompanha
a palavra hebraica que significa óleo. A primeira ocorrência está em Êx 26.6:“E
azeite para a luz, e especiarias para o óleo da unção, e especiarias para o incenso” (2004, p.183).
Ainda
na descrição de Vine (2004, p. 1043), a palavra grega correspondente é aleiphõ, “ termo geral usado para
descrever “unção” de qualquer tipo, quer do refrigério físico depois de se
lavar, por exemplo, na Septuaginta (Rt 3.3; 2 Sm 12.2; Dn 10.3; Mq 6.15)”.
Depois de uma simples abordagem do termo na cultura fora de Israel, como
também do seu uso secular, passaremos a abordar o sentido e a representação que
a unção tinha no contexto do Antigo Testamento.
Os
sinônimos “ungir, untar, consagrar”, provenientes do verbo hebraico mãshah, ocorrem cerca de 70 vezes no
Antigo Testamento de modo comum tanto no hebraico antigo quanto no moderno, no
dizer de Vine (2004, p. 318). Ainda segundo o autor:
O
Antigo Testamento usa mãshah comumente
para indicar “ungir” no sentido de uma separação
especial para um ofício ou função”[...] Os utensílios usados na adoração no
santuário sagrado (Tabernáculo e Templo) eram consagrados para o uso mediante a
unção (Êx 29.36; 30.26; 40.9,10). De fato, a receita para a formulação deste
“azeite da santa unção” é dada em detalhes em Êx 30.22-25 (IBIDEM, grifo meu).
O substantivo mashiah é a palavra que está mais intimamente ligada a Messias, ou
seja, ungido de modo singular. Na
concepção de Vine, constitui uma importante palavra para uma melhor compreensão
tanto do Antigo quanto do Novo Testamento. O termo indica uma unção específica
para um ofício ou função especial (VINE, 2004, p. 318).
Em sua
exposição, Champlin (1995, vol. 4, p. 241) afirma que “na cultura do Antigo
Testamento, Profetas, Sacerdotes e Reis eram ungidos, a fim de desempenharem sua tarefa ou missão especial”.
Além de conceder ao ungido uma capacidade excelente para o desempenho de um
ofício ou atividade especial, “o rito da unção emprestava aos homens uma
posição ímpar e sagrada, bem como a conveniente autoridade”[2].
Andrade cita que unção é “Untar com óleo
sagrado. Através deste ato eram consagrados os reis, sacerdotes e profetas de
Israel. No caso destes, nem sempre estava presente a unção, pois o chamamento
profético era mais espiritual que litúrgico” (2007, p. 352). Boyer aponta esta
unção como sendo oficial, dando-lhe destaque em relação às outras palavras,
afirmando que esta era:
[...]
conferida aos profetas, sacerdotes e reis. Foi conferida: Ao profeta Eliseu,
IRs 19.16; aos chamados “ungidos”, ICr 16.22; Sl 105.15; aos sacerdotes, Êx
29.29; Lv 4.3; 16.32; ao rei Saul, ISm 9.16; ao rei Davi, ISm 16.13; 2Sm 2.4;
5.3; e ao rei Salomão IRs 1.34,39 (2006, p. 661).
Halley
defende que, dentre as formas de unção, a mais importante está relacionada à
“[...] unção dos profetas (1Re
19.16; 1Cr 16.22), dos sacerdotes (Êx
28.41; 29.7; Lv 8.12,30) e dos reis (1Sm
9.16; 10.1; 16.1,12,13; 2Sm 2.7; 1Rs 1.34; 19.16)”, (2001, p. 394, grifos do
autor). O autor explica, com clareza, que o termo comum usado para reis era “o
ungido do Senhor” (1Sm 12.3; Lm 4.20). Isso pelo fato de que “o azeite
simbolizava o Espírito Santo, revestindo-os de poder para uma obra específica
no serviço de Deus” (IBIDEM).
Resumindo, podemos observar que a unção é
tida como importante e essencial nas culturas antigas. Havia unção para
pessoas, objetos, confecção de cosméticos etc. Assim, torna-se possível uma
compreensão conveniente deste assunto e sua aplicação a Jesus, mostrando,
através das definições, que, dentre as mais variadas formas de unção,
destaca-se aquela referente ao contexto de função, cargo ou atividade especial.
É exatamente o termo que corresponde a Cristo, mãshiah, nos escritos canônicos do Novo Testamento como também entre
os que surgiram no período intertestamentário, conhecidos como apócrifos e
pseudoepígrafos, conforme atestaram Coenen e Brown, em citação já feita por nós
no tópico 1.1 desta pesquisa. Portanto, de todas as formas de unção, aquela que
foi aplicada aos profetas, sacerdotes e aos reis investe-se de maneira ainda
mais especial em Jesus, porque Nele estão reunidas todas essas qualidades
determinadas pelo Pai, a fim de que pudéssemos experimentar uma segurança sem
igual Naquele que é O Perfeito Ungido.
O
NT demonstra que Jesus é o Messias esperado. Foi ungido com o Espírito Santo
por ocasião de seu batismo (Jo 1.32,33), como demonstração de que realmente era
o Messias (Lc 4.18, 21; At 9.22; 17.2,3; 18.5,28). É por isso que Jesus recebe
o título de “Cristo”, palavra grega que significa “Ungido”. Jesus, o Messias –
Jesus Cristo – é ungido para ser profeta, sacerdote e rei, tudo ao mesmo tempo
[...] (HALLEY, 2001, p. 394).
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