terça-feira, 9 de abril de 2013

A MANIFESTAÇÃO DOS OFÍCIOS EM JESUS - Por André Rodrigues



A MANIFESTAÇÃO DOS OFÍCIOS EM JESUS


 Depois de analisar questões voltadas a definições, passaremos a analisar como se procedeu em Jesus Cristo os ofícios de Profeta, Sacerdote e Rei, traçando um paralelo entre seus usos e aplicações no passado com os mesmos papéis desempenhados pelo Senhor em Seu Ministério. Analisaremos cada seção que revele esses ofícios tanto nos evangelhos como nos outros escritos do Novo Testamento.   


1. O que é um profeta  
     

Para darmos início a esta discussão, é necessário definirmos, de modo acentuado, os conceitos de cada expressão no original dada ao termo profeta. Berkhof faz uso desta prerrogativa na seção chamada por ele de “A ideia escriturística de profeta”. Fazendo uso dos termos aplicados na Escritura, diz:   



O Antigo Testamento emprega três palavras para designar um profeta, a saber, nabhi, ro’eh e chozeh. O sentido radical da palavra nabhi é incerto, mas, por passagens como Êx 7.1 e Dt 18.18, fica evidente que a palavra designa alguém que vem com mensagem da parte de Deus para o povo. As palavras ro’eh e chozeh acentuam o fato de que o profeta é alguém que recebe revelações da parte de Deus, particularmente na forma de visões. Outros designativos são “homens de Deus”, “mensageiro do Senhor” e “vigia”. Estes apelativos indicam que os profetas estão prestando serviços ao Senhor e velam pelos interesses espirituais do povo. No Novo Testamento usa-se a palavra prophetes, composta de pro e phemi. [...] a palavra prophemi não significa “falar de antemão”, mas “proferir”. O profeta é alguém que fala da parte de Deus. Desses nomes, tomados em conjunto, podemos deduzir que o profeta é alguém que vê coisas, isto é, que recebe revelações, que está a serviço de Deus, particularmente como mensageiro, e que fala em seu nome (2004, p. 328).




Soares corrobora a mesma definição de Berkhof e acrescenta ainda a quantidade de vezes em que cada palavra é apresentada nas Escrituras.  Nabi significa “porta-voz, orador, profeta”. De acordo com sua exposição, esta é a mais comum das definições e aparece 309 vezes (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTER, 1998, p. 904, apud, 2008, p. 98). A palavra hozeh “vidente”, ocorre por 18 vezes (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTER, 1998, p. 446, apud, IBDEM), e ro’eh, que também significa “vidente, como sinônimo de nabi ‘profeta’”, aparece 12 vezes (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTER, 1998, p. 1384, apud, IBDEM). Ainda em sua explicação, “a Septuaginta usa o termo (prophetes), do grego pro, “antes” e phemi “falar”, e a Vulgata Latina, propheta, para traduzir estes termos hebraicos” (2008, p. 98).
Andrade é simples em seu argumento, porém deixa importante detalhe para a compreensão da palavra:



[Do hb. Nabi; do gr. prophetes] No Antigo Testamento, era a pessoa devidamente vocacionada e autorizada por Deus para falar por Deus e em lugar de Deus (Ez 2.1-10). O profeta era um mestre incontestável quando sob a inspiração do Espírito Santo (2007, p. 305, grifo meu).




Dentro dessa perspectiva, outro autor comenta que “profeta é um porta-voz de Deus cujo teor da mensagem é de admoestação ou predição. Em certo sentido, os patriarcas mencionados nas Escrituras foram os primeiros profetas, desde Adão até Moisés” (BOYER, 2006, p. 537). Ele explica, com detalhes, como se dá o início propriamente dito desta função de modo específico. Por isso, acentua:


No sentido estrito, é a partir de Samuel[1] que começa o ministério profético. Entre esses profetas, encontram-se Elias, Elizeu e Davi. A partir dessa época, começa outra ordem de profetas, divididos em duas classes: 1) Os Profetas Maiores[2]: Isaías, Jeremias, Ezequiel, Daniel. 2) Os Profetas Menores, isto é, que deixaram escritos menos extensos que os livros dos Profetas Maiores, são em número de 12: Oséias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias (IBIDEM, grifos do autor).




“Os profetas são, portanto, a consciência espiritual da nação. São nomeados para fazer os reis, os sacerdotes e o povo lembrarem-se de suas obrigações diante de Deus e do próximo” (HALLEY, 2001, p. 295).



1.2. Outras configurações de profetas


De acordo com a exposição do termo, há ainda outras configurações de profetas inseridos no contexto escriturístico tanto vetero como neotestamentário. Duas classes distintas de profetas aparecem neste ambiente: os falsos profetas e as profetisas. “Está dito que os falsos profetas, embora não capacitados pelo Espírito divino, também profetizavam: “Não lhes falei a eles; todavia, eles profetizaram[1]” Jr 23.21. (VINE, 2004, p. 248). No Novo Testamento, a palavra em destaque para falso profeta é pseudoprophetes (VINE, 2004, p. 904). A palavra original para profetiza é (nebiah), e ocorre seis vezes no AT. (VINE, 2004, p. 249); enquanto no NT usa-se prophetis, o feminino de prophetes (ou seja, profeta) (VINE, 2004, p. 904). Boyer nos fornece explicações acerca destas configurações, seguindo a respectiva ordem:



Profetas falsos: Profetas impostores que se fazem passar por homens de Deus, mas não possuem autoridade divina, Dt 18.20; Is 9.15; Jr 14.13; Ez 13.3; Mt 7.15; 2Pe 2.1; 1Jo 4.1; Zedequias, 1Rs 22.11; Jr 29.21; Barjesus, At 13.6. Profetisa: O feminino de profeta; mulher que tinha revelações proféticas e as declarava. Exemplos: Miriã, Êx 15.20; Débora, Jz 4.4; Hulda, 2Rs 22.14; Ana, Lc 2.36; as quatro filhas de Filipe, At 21.9; v. Is 8.3; At 2.18; 1Co 11.5 (2006, p. 537, grifos do autor).



Do mesmo modo, com um detalhe mais intenso, somente acerca de profetisa “(heb., nevi’ah; gr. Prophetis)”, (DOUGLAS, Et All, 2006, p. 1102), outro autor acentua que, nos dois concertos, mulheres atuaram de modo relevante e particular em alguns casos:



Algumas profetisas do Antigo e do Novo Testamentos foram esposas de profetas, ou, pelo menos, atuaram em íntima associação com líderes masculinos do judaísmo ou do cristianismo. Contudo houve algumas exceções. As mulheres chamadas profetisas no Antigo Testamento são: Miriã, irmã de Moisés (Êx 15.20); Débora, Juíza de Israel (Jz 4.4); Hulda (IIRs 2.14); Noadia (Ne 6.14), profetisa falsa que se opôs a Neemias. A esposa de Isaías também é chamada “profetisa”, em Is 8.3; o que dá a entender que ela era mais do que simplesmente a esposa de um profeta. No Novo Testamento: Ana (Lc 2.36 ss); muitas profetisas estiveram ativas durante os tempos apostólicos (At 2.17; Ico 12.10, 28ss; 13.1ss; 14.1-33). O evangelista Filipe tinha quatro filhas que profetizavam (At 21.9). Jezabel foi uma notória profetisa falsa, que exercia considerável poder sobre as igrejas da Ásia Menor (Ap 2.20) (CHAMPLIN, 1995, vol. V, p. 439).



Dessa forma, concluímos que essas duas classes sempre estiveram presentes entre os profetas verdadeiramente constituídos. Uns para auxílio, como no caso de algumas profetisas; outros para fins de confusão, como se percebe nos falsos profetas, que “eram indivíduos não reconhecidos pelo Senhor, a quem professavam servir” (CHAMPLIN, 1995, vol. V, p. 438).


2.1. Contexto bíblico do profeta constituído


 Neste momento, surge a necessidade de analisarmos como era a forma de comportamento de um verdadeiro profeta constituído por Deus. É notório que a atuação de um profeta se estabelecia a partir do pressuposto de que se transmitia através dele uma mensagem de outrem. Em contexto geral, Hodge ressalta:



Segundo o uso bíblico, um profeta é alguém que fala em nome de outro. Em Êxodo 7.1, lemos: “Vê que te constituí como Deus sobre Faraó; e Arão, teu irmão, será teu profeta”. Moisés seria a fonte autoritativa da comunicação, e Arão, o órgão dessa fonte. Esta é a relação do profeta com Deus. Deus comunica, e o profeta anuncia a mensagem que ele recebeu. Em Êxodo 4.16, lemos de Arão em relação a Moisés: “Ele fará por ti ao povo; ele te será por boca, e tu lhe serás por Deus”. E em Jeremias 15.19, lemos sobre o profeta: “Serás a minha boca”. Na instituição de um profeta, ou na constituição de um homem como porta-voz de Deus, lemos: “Sucitar-lhes-ei um profeta do meio de seus irmãos, semelhante a ti, em cuja boca porei as minhas palavras, e ele lhes falará tudo o que eu lhe ordenar. De todo aquele que não ouvir minhas palavras, que ele falar em meu nome, disso lhe pedirei contas”. (Dt 18.18,19). Um profeta, pois, é alguém que fala em nome de Deus. Deve contudo, ser o órgão imediato de Deus (HODGE, 2001, p. 828).




O que foi exposto por Hodge é de outra maneira, entretanto, com a mesma essência, definido por Berkhof como sendo a reunião do que ele chama de “dois elementos” numa ação comum: 



As passagens clássicas de Êx 7.1 e Dt 18.18, indicam a presença de dois elementos na função profética, um passivo e outro ativo, um receptivo e outro produtivo. O profeta recebe revelações divinas em sonho, visões ou comunicações verbais; e as transmite ao povo, quer oralmente, quer visivelmente, nas ações proféticas, Nm 12.6-8; Is 6; Jr 1.4-10; Ez 3.1-4,17. Destes dois elementos, o passivo é o mais importante, porquanto ele governa o elemento ativo. Sem receber, o profeta não pode dar, e ele não pode dar mais do que recebe. Mas o elemento ativo também é parte integrante (2004, p. 328, 329).




Nessa ótica, percebemos perfeitamente que o profeta é alguém que possui intimidade com Deus e está sob as ordens de Deus, prestes a falar tudo aquilo que recebeu da parte Dele. Essas qualidades, sem dúvida, estiveram presentes na vida dos antigos profetas, os quais foram usados de maneira particular para mostrarem ao povo as verdades absolutas e atraírem as outras nações ao Deus de Israel[2]


2.2. A atuação de Jesus como Profeta


Na seção anterior, ainda que de forma singular, mostramos, em um contexto geral, como os profetas se completavam e se relacionavam com Deus, agindo em conexão e estreita comunhão. Com Jesus não foi diferente. Ele possuía uma intimidade pessoal com o Pai e recebeu Dele a Unção do Profeta. Daquele que havia sido vaticinado por Moisés no livro de Deuteronômio[3]. Ele era o cumprimento daquela profecia e tinha por finalidade atrair todo o homem de volta a Deus, como se dava no princípio do Seu plano original para o homem. Cullmann descreve:        

                                                                

O antigo profetismo havia se extinguido progressivamente; e praticamente não existia mais senão sob a forma escrita de livros proféticos. Isto por si bastaria para mostrar que, ao chamar a Jesus “profeta”, não se classificava-o simplesmente em uma categoria profissional determinada. Porém, o argumento decisivo é que na maior parte das passagens onde este título é dado, Jesus não aparece somente como um profeta, mas como o profeta – a saber: o último profeta, aquele que deveria “cumprir” toda profecia, no final dos tempos (2008, p. 31).




Em concordância com Cullmann, outro expositor destaca que “a vinda de Cristo, juntamente com suas obras, estava prevista na Lei de Moisés e nos profetas, desde o seu nascimento até a sua ascensão ao céu”. E conclui:



Deus prometeu levantar em Israel um Grande Profeta igual a Moisés [...] (Dt 18.15, 18). O apóstolo Pedro, mais de uma vez, no dia de Pentecostes e no discurso após a cura do coxo, na porta chamada Formosa, em Jerusalém, apresentou o perfil de Cristo no Antigo Testamento, provando assim que os últimos acontecimentos eram cumprimento das Escrituras. Ele afirma que essa profecia se cumpriu em Jesus (At 13.22, 23) (SOARES, 2008, p. 101).