segunda-feira, 31 de maio de 2010

GRUPOS RELIGIOSOS DO NOVO TESTAMENTO

O Novo Testamento observa a presença de partidos religiosos que eram desconhecidos no Velho Testamento. A fonte principal de informação é encontrada nas obras de Flávio Josefo. Em dois de seus livros, As Guerras dos Judeus (II, viii, 1-4) e As Antigüidades dos Judeus (XIII, v. 9), ele escreve acerca de quatro desses partidos: fariseus, saduceus, zelotes e essênios. Para nossos propósitos, os herodianos e os zadoqueus devem ser acrescentados. Os samaritanos já foram mencionados.

1. Fariseus — O grupo maior e mais importante é o chamado os fariseus. A palavra em si significa "separatistas", tendo sido, provavelmente, aplicada como expressão de escárnio aos oponentes. Eles fizeram seu primeiro aparecimento definido como um grupo com este nome durante a época de João Hircano I. Alguns estudiosos dizem que o termo foi pela primeira vez usado quando alguns judeus piedosos "se separaram" de Judas Macabeu, depois de 165 a.C. É mais provável que eles foram os sucessores dos "hasidins", que se haviam empenhado em "separar-se" do pecado, e na "separação" (interpretação) das Escrituras, durante as reformas de Esdras e Neemias.

Seja qual for sua origem, os fariseus foram o resultado final do movimento que teve seus primórdios com Esdras, intensificado pelos hasidins, sob os sírios e romanos. Eles representam aquela tendência, no judaísmo, que sempre reagiu contra dominadores estrangeiros, mantendo o exclusivismo judaico e a lealdade à tradição dos pais. Pouco se interessavam no poder político, mas se tornaram os mentores políticos de Israel. Eles tinham maior controle sobre o povo do que os saduceus, que eram mais abastados e politicamente poderosos. Controlavam a sinagoga, e só eles sobreviveram à Guerra Judaico-Romana de 66-70.

Devido à sua profunda reverência para com os ideais nacionais e religiosos judaicos, e devoção aos mesmos, os fariseus se opuseram à introdução das idéias gregas, e não deixou de ser natural que se tornassem o partido reacionário. Para eles, as coisas velhas eram as únicas coisas boas. Num desejo sincero de tornar a lei praticável dentro do mundo greco-romano em mudança, os fariseus aderiram ao sistema da tradição dos pais. Começando com as Escrituras, eram feitas interpretações para se ajustar uma situação existente ou combater um erro em teologia. Nas tentativas de responder a problemas levantados por religiões intrusas, muitas idéias dormentes no Velho Testamento foram desenvolvidas e aumentadas. Entre essas doutrinas desenvolvidas durante esses 400 anos estão a ressurreição dos mortos, os demônios, os anjos e a esperança messiânica.

Para o fariseu, a tradição oral suplantou a lei. Este era o principal ponto em que divergiam dos saduceus, que não viam nenhuma necessidade de alterar-se a lei. Os fariseus diziam que as finas distinções das tradições orais eram para facilitar o cumprimento da lei sob novas condições e tornar virtualmente impossível pecar-se. Eles também colocavam uma forte ênfase sobre a providência divina nos assuntos do homem.

2. Saduceus — Embora a origem da seita esteja perdida na obscuridade, o nome pode ter-se derivado de um certo Zadoque, que sucedeu Abiatar como sumo sacerdote durante os dias de Salomão. Pode ter vindo da palavra hebraica "zoddikim", que significa "os justos". Os saduceus gabavam-se de sua fidelidade à letra da lei mosaica, em contradistinção à tradição oral. Este era o partido da aristocracia e dos sacerdotes abastados. Eles controlavam o sinédrio e qualquer resquício de poder político que restava. Eram os colaboracionistas, a tendência que favorecia o poder estrangeiro e que se alinhava com ele pelo poder. Também controlavam o templo. O sumo sacerdote era sempre o líder deste grupo. Era um grupo fechado e não procurava prosélitos, como o faziam os fariseus.

Teologicamente conservadores (diziam),limitavam o cânon à Torah ou Pentateuco. Rejeitavam as doutrinas da ressurreição, demônios, anjos, espíritos, e advogavam a vontade livre, em lugar da providência divina. Este grupo não sobreviveu à Guerra Judaico-Romana de 66-70.

3. Zelotes — Os zelotes representavam o desenvolvimento na extrema esquerda entre os fariseus. Estavam interessados na independência da nação e sua autonomia, ao ponto de negligenciarem toda outra preocupação. Segundo Josefo, o fundador foi Judas de Gamala, que iniciou a revolta sobre o censo da taxação, em 6 d.C. Seu alvo era sacudir o jugo romano e anunciar o reino messiânico. Eles precipitaram a revolta em 66 d.C, que levou à destruição de Jerusalém em 70. Simão, o zelote, foi um dos apóstolos.

4. Essênios — Estes representavam o desenvolvimento na extrema direita entre os fariseus. Eram uma ordem distinta, na sociedade judaica, mais que uma seita dentro dela. Sendo o elemento mais conservador dos fariseus, eles enfatizavam a observação minuciosa da lei. Formavam uma comunidade ascética ao redor do Mar Morto, e viviam uma vida rigidamente devota. Eram a sobrevivência dos hasidins mais estritos, influenciados pela filosofia grega. A partir dos documentos de Qumram, parece que eles aguardavam um messias que iria combinar as linhagens real e sacerdotal, numa estrutura escatológica. Este grupo não é mencionado em o Novo Testamento.

5. Herodianos — Os saduceus da extrema esquerda eram conhecidos como os herodianos. Tirando o nome da família de Herodes, eles baseavam suas esperanças nacionais nessa família e olhavam para ela com respeito ao cumprimento das profecias acerca do Messias. Eles surgiram em 6 d.C, quando Arquelau, filho de Herodes, o Grande, foi deposto, e Augusto César enviou um procurador, Copônico. Os judeus que favoreciam a dinastia herodiana eram chamados "herodianos". Este grupo é mencionado em Mateus 22:16 e Marcos 3:6; 12:13.

6. Zadoqueus — Na extrema direita dos saduceus estava o grupo conhecido como os zadoqueus. Embora não mencionados em o Novo Testamento, este grupo é importante, porque mostra outra tendência entre os saduceus, talvez dando uma chave quanto à sua origem. Em 1896, um fragmento de um documento foi encontrado numa sinagoga no Cairo. Publicado em 1910, com o título Fragmentos de uma Obra Zadoquita, este termo entrou em todas as discussões acerca do judaísmo sectário. A descoberta de outros documentos na comunidade de Qumram, do Mar Morto, sugere alguma relação entre os zadoqueus, os essênios e a comunidade de Qumram. Um movimento de reforma foi iniciado entre os sacerdotes (filhos de Zadoque), entre os saduceus, durante o início do segundo século a.C. Quando a reforma fracassou, eles foram para Damasco e estabeleceram uma comunidade sob um novo conjunto de regulamentos, denominado "o novo concerto". Alguns posteriormente voltaram como missionários para sua terra natal e depararam com amarga oposição por parte dos fariseus e saduceus. Alguns, então, encontraram seu caminho em direção às comunidades ao redor do Mar Morto. Eram missionários fervorosos, em busca de um mestre de justiça que chamasse Israel de volta ao arrependimento e apareceria no advento do Messias. Eles aceitavam toda palavra escrita, mas rejeitavam a tradição oral. Eram muito abnegados na vida pessoal e leais aos regulamentos da pureza levítica. Deram grande ênfase à necessidade de arrependimento.


Hale, Broadus David - Introdução ao estudo do Novo Testamento. Tradução de Cláudio Vital de Souza. Rio de Janeiro, Junta de Educaçã Religiosa e Publicações, 1983.

domingo, 23 de maio de 2010

O CÂNON DO NOVO TESTAMENTO



Como no Antigo Testamento, homens inspirados por Deus escreveram aos poucos os livros que compõem o canon do Novo Testamento. Sua formação levou apenas duas gerações: quase 100 anos. Em 100 d.C. todos os livros do Novo Testamento estavam escritos. O que demorou foi o reconhecimento canônico, isto motivado pelo cuidado e escrúpulo das igrejas de então, que exigiam provas concludentes da inspiração divina de cada um desses livros. Outra coisa que motivou a demora na canonização foi o surgi¬mento de escritos heréticos e espúrios com pretensão de autoridade apostólica. Trata-se dos livros apócrifos do Novo Testamento, fato idêntico ao acontecido nos tempos do encerramento do cânon do Antigo Testamento.

A ordem dos 27 livros do Novo Testamento, como temos atualmente em nossas Bíblias, vem da Vulgata, e não leva em conta a seqüência cronológica. 58 Livros esaparecidos, citados no Novo Testamento. Há também livros mencionados no Novo Testamento até agora desaparecidos (1 Co 5.9; Cl 4.16).

a. Ás Epístolas de Paulo. Foram os primeiros escritos do Novo Testamento. São 13: de Romanos a Filemom. Foram escritas entre 52 e 67 d.C. Pela ordem cronológica, o primeiro livro do Novo Testamento é 1 Tessalonicenses, escrito em 52 d.C. 2 Timóteo foi escrita em 67 d.C, pouco antes do martírio do apóstolo Paulo em Roma. Esses livros foram também os primeiros aceitos como canônicos. Pedro chama os escritos de Paulo de "Escrituras" - título aplicado somente à Palavra inspirada de Deus! (2 Pe 3.15,16).

b. Os Atos dos Apóstolos. Escrito em 63 d.C, no fim dos dois anos da primeira prisão de Paulo em Roma (At 28.30).

c. Os Evangelhos. Estes, a princípio, foram propagados oralmente. Não havia perigo de enganos e esquecimento porque era o Espírito Santo quem lembrava tudo e Ele é infalível (Jo 14.26). Os Sinóticos foram escritos entre 60 a 65 d.C. Marcos, em 65. Em 1 Timóteo 5.18, Paulo, escrevendo em 65 d.C, cita Mateus 10.10. João foi escrito em 85. Entre Lucas e João foram escritas quase todas as epístolas. Note-se que Paulo chama Mateus e Lucas de "Escrituras" ao citá-los em 1 Timóteo 5.18; o original dessa citação está em Mateus 10.10 e Lucas 10.7.

d. As Epístolas, de Hebreus a Judas, foram escritas entre 68 e 90 d.C. Quanto à autoria de Hebreus, só Deus sabe de fato. Agostinho (354-430 d.C), bispo de Hipona, África do Norte, afirma que seu autor é Paulo. As igrejas orientais atribuíram-na a Paulo, mas as ocidentais, até o IV século recusaram-se a admitir isto. A opinião ainda hoje é a favor de Paulo. Orígenes (185-254) - o homem mais ilustre da igreja antiga, e, anterior a Agostinho - afirma: "Quem a escreveu só Deus sabe com certeza".

e. O Apocalipse. Escrito em 96 d.C, durante o reinado do imperador Domiciano.
Muitos livros antes de serem finalmente reconhecidos como canônicos foram duramente debatidos. Houve muita relutância quanto às epístolas de Pedro, João e Judas bem como quanto ao Apocalipse. Tudo isto tão-somente revela o cuidado da Igreja e também a responsabilidade que envolvia a canonização. Antes do ano 400 d.C, todos os livros estavam aceitos. Em 367, Atanásio, patriarca de Alexandria, publicou uma lista dos 27 livros canônicos, os mes¬mos que hoje possuímos; essa lista foi aceita pelo Concilio de Hipona (África) em 393.


Data do reconhecimento e fixação do cânon do Novo Testamento

Isso ocorreu no III Concilio de Cartago, em 397 d.C. Nessa ocasião, foi definitivamente reconhecido e fixado o cânon do Novo Testamento. Como se vê, houve um amadurecimento de 400 anos.

A necessidade da mensagem escrita do Novo Testamento

A mensagem da Nova Aliança precisava ter forma escrita como a da Antiga. Após a ascensão do Senhor Jesus, os apóstolos pregaram por toda parte sem haver nada escrito. Sua Bíblia era o Antigo Testamento. Com o correr do tempo, o grupo de apóstolos diminuiu. O Evangelho espalhou-se. Surgiu a necessidade de reduzi-lo à forma escrita, para ser transmitido às gerações futuras. Era o plano de Deus em marcha. Muitas igrejas e indivíduos pediam explicações acerca de casos difíceis surgidos por perturbações, falsas doutrinas, problemas internos, etc. (Ver 1 Coríntios 1.11; 5.1; 7.1.)
Os judeus cumpriram sua missão de transmitir ao mundo os oráculos divinos (Rm 3.2). A Igreja também cumpriu sua parte, transmitindo as palavras e ensinos do Senhor Jesus, bem como as que Ele, pelo Espírito Santo inspirou aos escritores sacros. Ele mesmo disse: "Tenho muito que vos dizer... mas o Espírito de verdade... dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará o que há de vir" (Jo 16.12,13).
Dão testemunho da existência de livros do Novo Testamento, em seu tempo, os seguintes cristãos primitivos, cujas vidas coincidiram com a dos apóstolos ou com os discípulos destes:
Clemente de Roma, na sua carta aos Coríntios, em 95 d.C. cita vários livros do Novo Testamento.
Policarpo, na sua carta aos Filipenses, cerca de 110 d.C, cita diversas epístolas de Paulo.
Inácio, por volta de 110, cita grande número de livros em seus escritos.
Justino Mártir, nascido no ano da morte de João, escrevendo em 140 d.C, cita diversos livros do Novo Testamento.
Irineu (130-200 d.C), cita a maioria dos livros do Novo Testamento, chamando-os "Escrituras".
Orígenes (185-254 d.C), homem erudito, piedoso e viajado, dedicou sua vida ao estudo das Escrituras. Em seu tempo, os 27 livros já estavam completos; ele os aceitou, embora com dúvida sobre alguns (Hebreus, Tiago, 2 Pe¬dro, 2 e 3 João).

DATAS E PERÍODOS SOBRE O CÂNON EM GERAL

O Antigo Testamento foi escrito no espaço de mais ou menos 1.046 anos; de 1491 a 445 a.C, isto é, de Moisés a Esdras. A data 445 é apenas um ponto geral de referência cronológica quanto ao encerramento do cânon do Antigo Testamento. Se entrarmos em detalhes sobre o último livro do Antigo Testamento em ordem cronológica - Malaquias, teremos uma variação de espaço de tempo como veremos a seguir. O Pentateuco, como já vimos, foi iniciado cerca de 1491 a.C. Malaquias, o último livro do Antigo Testamento por ordem cronológica, foi escrito após 445, no final do governo de Neemias e do sacerdócio de Esdras. Ora, isto foi a partir de 432, quando Neemias regressou a Jerusalém, procedente da Pérsia, para onde tinha ido em 434, a fim de renovar sua licença (Ne 13.6). É a partir desse ano que Malaquias entra em cena. Quando ele escreveu, talvez Neemias não estivesse mais na Palestina, porque não o menciona em seu livro, como fazem Ageu e Zacarias, profetas seus antecessores, os quais mencionam Zorobabel e Josué, respectivamente, governador e sacerdote dos repatriados. (Ver Zacarias capítulos 3 e 4 e Ageu 1.1.)
Malaquias não menciona nominalmente Neemias, apenas menciona o "Governador" (Ml 1.9). O próprio livro de Malaquias apresenta outras evidências internas que o colocam de 432 em diante, como passamos a mostrar:

a. Em Malaquias 2.10-16, vê-se que os casamentos ilícitos que Esdras corrigira antes de Neemias, em 516 (Ed 9 e 10), estavam ocorrendo outra vez. Isto coincide com o estado descrito em Neemias 13, acontecido em 432.

b. Em Malaquias 3.6-12, havia pobreza no tesouro do templo. Situação idêntica à de Neemias 13, reinante em 432.

c. As referências de Malaquias 1.13; 2.17; 3.14, indicam que o culto levítico já havia sido restaurado há bastante tempo. Essa restauração temo-la ampliada em Neemias 12.44 ss.

Portanto, Malaquias deve ter sido escrito cerca de 432 a.C. Repetimos o que dissemos há pouco: a data 445 é apenas um ponto geral de referência quanto ao encerramento do cânon do Antigo Testamento. Foi esse o ano em que Esdras iniciou seu grande ministério entre os repatriados de Israel. Se descermos a detalhes quanto ao livro de Malaquias, partiremos de 432. Malaquias é o último livro do Antigo Testamento, quanto à ordem cronológica. Quanto à disposição dos livros no corpo do cânon hebraico, o último livro é 2 Crônicas, como já mostramos.
O Novo Testamento foi completado em menos de 100 anos, pois seu último livro, o Apocalipse, foi escrito cerca de 96 d.C. Isto é, dá um total de 1.142 anos para a formação de ambos os Testamentos (1.046 + 96). (Leve-se em conta que a cronologia bíblica é sempre aproximada, pois os povos orientais não tinham um sistema fixo de computação de datas.)
Quando se fala do espaço total de tempo, que vai da escrita do Pentateuco ao Apocalipse, é preciso intercalar os 400 anos do Período Interbíblico ocorrido entre os Testamentos, o que dará um total de 1.542 anos (1.046 + 96 + 400). Por isso se diz que a Bíblia foi escrita no espaço de 16 séculos. Este é o período no qual o cânon foi completado. Noutras palavras: o cânon abrange na História um total de 1542 anos, porém foi escrito em 1.142 anos, aproximadamente.

FONTE: A BÍBLIA ATRAVÉS DOS SÉCULOS - ANTÔNIO GILBERTO - 15ª EDIÇÃO 2004 - CPAD

domingo, 16 de maio de 2010

A INSPIRAÇÃO

a) O significado da inspiração

A palavra inspiração, não sendo bíblica, significa, normalmente, uma influência sobrenatural do Espírito de Deus sobre os autores bíblicos, garantindo que, aquilo que escreveram era precisamente o que Deus pretendia que eles escrevessem para a transmissão da verdade divina, podendo, por isso, dizer-se realmente "inspirados" ou theopneustos, literalmente, "soprados por Deus" (#2Tm 3.16). Como já não é novo para nós este assunto, limitar-nos-emos agora a corrigir alguns equívocos.

A "inspiração" que garante a comunicação infalível da verdade revelada é bem distinta da "inspiração" do artista criador. Nada de confusões. A inspiração não só não implica estado anormal do espírito do escritor, -por exemplo, visões ou audição de vozes estranhas, -como não supõe, também, a aniquilação da sua personalidade. Deus providencialmente preparou os meios humanos de inspiração para que os escritores pudessem cumprir a sua tarefa; e, na maior parte dos casos, apenas através das faculdades normais. Muitos estados de espírito são na realidade compatíveis com a inspiração. Não é necessário supor-se que os autores tinham sempre a consciência de que estavam a ser inspirados, quer dizer, que sabiam estar a escrever as Escrituras Canônicas. Nem há razão para afirmar-se que um documento inspirado não possa, na providência divina, ter sido compilado ou extraído de fontes por um processo vulgar de composição histórica, passando por várias edições até atingir a sua forma definitiva. O que deve admitir-se é que no fim de contas a obra foi theopneustos, e que através dela Deus quis comunicar aos homens a Sua graça salvadora. Sendo assim, só podemos admitir a inspiração verbal. E se as palavras da Escritura são inspiradas por Deus, é quase uma blasfêmia não admitir a infalibilidade da sua doutrina, e a ausência de erro nessas palavras. São prerrogativas que não podemos aprovar, ou desaprovar, através da argumentação vulgar; porque as consideramos artigos de fé, baseadas que são na doutrina de Cristo e no testemunho do Espírito a confirmarem que as Escrituras Canônicas foram inspiradas por um Deus que não pode mentir. Quem as nega rejeita o testemunho de Cristo, dos apóstolos e da própria Igreja Cristã relativo à natureza da "Palavra de Deus" escrita, e com certeza não possui nem compreende o testemunho interno do Espírito Santo.

b) O problema da inspiração

Nenhuma doutrina cristã está isenta de problemas, e isto porque Deus quis que a Sua verdade fosse um objeto de fé. Ora, o fundamento da fé é o testemunho e a autoridade do próprio Deus; donde se segue que são coisas distintas o acreditar numa autoridade e o acreditar em face duma demonstração racional. O pecado original do homem foi um desejo de evidenciar a sua sabedoria auto-suficiente, uma vontade de não admitir qualquer autoridade externa, capaz de agir por si própria (cfr. #Gn 3.5,6); e Deus deliberadamente apresenta a verdade salvadora aos pecadores e de tal forma que, ao aceitá-la, supõe-se um ato de arrependimento intelectual de sujeição à doutrina de Deus. Daí a renúncia à própria sabedoria (cfr. #Rm 1.22; #1Co 1.19-25) a fim de que só possa sobressair aquela outra sabedoria, que é apanágio dos que ouvem a Palavra do Senhor. Para ser mais completa essa renúncia, Deus determinou, ou melhor, garantiu, que nem um só artigo de fé pudesse ser demonstrado, tal como qualquer teorema geométrico. O homem deve contentar-se com o conhecimento que adquire pela fé, conhecimento esse que, no fim de contas, jamais poderá atingir a perfeição neste mundo. Não conseguiremos, pois, eximir de dificuldades a doutrina da Inspiração Bíblica, tal como sucede com a doutrina da Trindade ou da Encarnação. Nem esperemos neste mundo resolver todos os problemas. Não é de admirar, portanto, que muitos cristãos caiam na heresia, a respeito desta ou doutras doutrinas. Convém, no entanto, indicar qual a atitude a tomar perante os erros que se nos apresentem.

Em primeiro lugar, esta doutrina não raro é amesquinhada por aqueles que dizem professá-la, e afirmam que a Bíblia é produto da inspiração em certo sentido, mas nunca inspiração verbal. Deus inspirou ou revelou a verdade aos escritores, que sendo criaturas falíveis e pecaminosas, poderiam falsificá-la. Por isso, é possível admitirmos erros nas Escrituras. Mas não foi assim, como vimos, o pensar de Cristo e dos apóstolos. É errado o pensamento de que nem todos os livros da Bíblia estão ao mesmo nível de profundidade espiritual e finalidade de doutrina; mas, na Sua providência soberana, podia Deus preparar e dirigir os instrumentos humanos apenas para escreverem precisamente aquilo que entendesse, nem mais nem menos. Por outras palavras, segundo esta teoria, a Bíblia não é aquilo que Deus pretendia, nem aquilo que Cristo pensava e ensinava. É evidente que tal teoria é inadmissível.

Em segundo lugar, rejeita-se por vezes a nossa doutrina, recorrendo-se a pretensos argumentos internos da Bíblia. Tais objeções, todavia, supõem fundamentalmente uma idéia humana a priori daquilo que provavelmente será a Bíblia inspirada. E, só o fato de as apresentar como argumentos válidos para duvidar do que Deus afirma desse livro, é já um sinal de impenitência intelectual, inconsciente talvez, mas não menos real por isso. O melhor é, na realidade, começar por aceitar o testemunho de Deus sobre a inspiração verbal, e só depois examinar os argumentos internos da Escritura para se chegar à conclusão da probabilidade da inspiração verbal. Por mais rigoroso e profundo que seja o exame, verificar-se-á que a inspiração se adapta perfeitamente a todas as formas do pensamento, a todos os métodos literários, a todas as figuras estilísticas e a todas as características vocabulares dos escritores. Estes são os canais condutores da verdade inspirada. Desconhecê-los, pode ser um perigo, pois é possível não se conhecer a intenção de Deus, e nesse caso descobrir erros onde na realidade não existem. Ao estudar-se a Bíblia, deve seguir-se o princípio, baseado na fé, de que a Escritura, em parte alguma é capaz de adulterar a verdade, sendo inspirada para no-la transmitir, e de que todos os acontecimentos bíblicos têm um significado que só a Igreja pode conhecer perfeitamente. Neste caso, é conveniente apreciar o texto a analisar à luz do contexto bíblico da Escritura, considerada no seu todo. Trata-se dum princípio de importância fundamental para a interpretação bíblica, que nunca se deve perder de vista, mesmo no meio das dificuldades que possam surgir a este respeito. Vamos citar aqui um exemplo apenas.

Várias vezes se diz que certas atitudes, ações e reflexões teológicas são uma refutação da doutrina duma Escritura inspirada. É uma objeção que só revela incompreensão da natureza da Bíblia. Já frisamos que a Bíblia é mais do que um simples amontoado de textos separados; é um organismo, um conjunto homogêneo, cujas partes não se podem explicar isoladamente. Ora, Deus recolheu diferentes materiais para a Sua obra; por isso não admira, que muitos dos exemplos apontados sejam maus. É que tudo serve para nossa instrução, embora tais exemplos possam ser interpretados de diferentes modos. Fala-se em erros teológicos e práticos, supondo-se que pelo fato de aparecerem na Bíblia têm a aprovação de Deus. Os princípios da teologia bíblica devem interpretar os fatos da história e da biografia bíblicas, uma vez que estes também explicam aquela. A Escritura interpreta-se com o auxílio da mesma Escritura. Já se disse que a Bíblia constitui uma unidade orgânica, que a Palavra de Deus é um todo, e que cada texto deve ser compreendido à luz da verdade que se encontra em Jesus.

Impossível aqui apresentar mais argumentos a favor da nossa tese. Limitar-nos-emos a afirmar, em conclusão, que a atitude da fé para com a doutrina da inspiração bíblica, bem como para com outras doutrinas, é a de aceitar única e simplesmente o testemunho de Deus. Nada, por isso, poderá abalar a nossa fé, já que nada pode abalar o testemunho em que se apóia. Quando tiver de enfrentar as dificuldades e as objeções, que implicam com a sua fé, o crente deve lembrar-se mais da sua possibilidade de falhar do que da infalibilidade do testemunho de Deus, ao apresentar-nos a verdade. Recorra-se, nesse caso, a uma cuidadosa retrospecção à luz dum estudo mais profundo e mais eficaz da evidência bíblica. Foi assim que se fizeram progressos doutrinários através da história da Igreja. Será assim que também nos nossos dias se conseguirá uma compreensão mais fiel e mais perfeita da doutrina da inspiração da Bíblia, aceitando-a como a Palavra de Deus, isenta de erro e infalível.

J. I. PACKER/ O NOVO COMENTÁRIO DA BÍBLIA - Ed. Vida - SP

quarta-feira, 5 de maio de 2010

DEMÔNIO E POSSESSÃO DEMONÍACA

Demônio é um anjo que se rebelou contra Deus ao seguir as ordens de Satanás. Os demônios executam as ordens de Satanás e tentar induzir as pessoas a desobedecerem o desejo de Deus. Quando eles entram realmente na vida dos seres humanos, isso é chamado de possessão demoníaca. Há muitos exemplos na Bíblia e uma grande parte do trabalho de Jesus na terra envolveu a cura de pessoas controladas pelos demônios.

QUEM SÃO OS DEMÔNIOS

A palavra demônio é de origem grega e significa "falsa deidade" (I Coríntios 10:20). Qualquer deidade que não seja o Deus verdadeiro é um espírito que se opõe a Ele, logo é um espírito do mal ou um demônio. Há só um diabo, que é conhecido por uma variedade de nomes e títulos na Bíblia. O diabo governa sobre todos os outros demônios, que lhe são sujeitos.

Muitas vezes na Bíblia a palavra "espírito" é usada por demônio, com um descritivo. Por ex. a Bíblia menciona "espírito do mal" (Atos 19:12-13), "espírito imundo" (Mateus 10:1, Marcos 1:23, 26; Atos 5:16), "espírito de enfermidade" (Lucas 13:11) e "espírito mudo e surdo" (Marcos 9:25). Alguns demônios possuem o espírito de assassinato, suicídio, medo ou mentira, o que os associa com vários pecados ou atitudes contrários à vontade de Deus.

Demônios são seres criados. São imortais e não podem voltar a ter seu relacionamento anterior com Deus. Têm grandes poderes quando comparados a humanos, mas seus poderes não se comparam com o poder de Deus. Deus nos deu autoridade sobre eles e os cristãos que crêem no poder de Jesus não podem ser conquistados pelo poder dos demônios.

O QUE FAZEM OS DEMÔNIOS

Os anjos foram criados para adorar e louvar a Deus, servi-lO e agir como seus mensageiros. A Bíblia afirma que eles são "espíritos enviados por Deus para cuidar daqueles que receberão salvação"(Hebreus 1:14). Os demônios têm função similar, mas servem a um mestre diferente. São governados por Satanás, a quem servem sem temor. Atuam nas vidas dos seres humanos, mas seu propósito é cumprir os esquemas de Satanás e fazer oposição a Deus. Tentam, enganam e iludem as pessoas com a intenção de trazê-las para a condenação eterna. Constantemente atacam, oprimem e acusam o povo de Deus. Uma vez que Satanás não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo, usa os demônios para executarem diferentes tarefas. Por ex., na parábola do semeador (Mateus 13:3-9, Marcos 4:1-20, Lucas 8:4-15) os demônios arrancam fora a palavra antes que ela possa enraizar (Marcos 4:15). Muitas vezes, Satanás promove o afastamento de algumas pessoas de Deus antes que façam um genuíno compromisso (Marcos 4:17).

Basicamente, os demônios trabalham de acordo com o padrão estabelecido por Satanás na sua tentação de Eva no Jardim do Éden. Primeiro, negam a verdade da Palavra de Deus e contestam as afirmações que faz. Em seguida, negam a realidade da morte. Finalmente, apelam para a vaidade e orgulho humanos dizendo que homens e mulheres podem ser iguais a Deus ou mesmo serem deuses (Gênesis 3:1-5). Esses são os métodos e ensinos básicos que estão por trás da maioria dos cultos e das falsas religiões.

DESTINO FINAL DOS DEMÔNIOS

A Bíblia nos conta que Deus tomou os anjos que pecaram contra Ele e os "precipitou no inferno e os entregou a abismos de trevas, reservando-os para juízo" (II Pedro 2:4). Jesus falou sobre o fogo eterno preparado para o diabo e seus demônios. Também descreveu como as pessoas que não crerem nEle terão da mesma forma esse horrível destino na eternidade (Mateus 25:41). Eventualmente Satanás e seus demônios serão lançados no lago de fogo (Apocalipse 20:10), que é o lugar de tormenta eterna para todas as pessoas cujos nomes não estão escritos no Livro da Vida (Apocalipse 20: 12-15).

POSSESSÃO DEMONíACA

A possessão demoníaca ocorre quando um demônio ocupa o espírito de um ser humano. A Bíblia nos fala que demônios podem entrar no corpo de uma pessoa (Lucas 8:30, 22:3) a fim de controlar seus pensamentos e ações. Todos os cristãos pertencem a Jesus Cristo e seus espíritos humanos são selados pelo Espírito Santo (Efésios 1:13). Os demônios conhecem e reconhecem este selo. Eles podem também entrar no corpo de animais (Marcos 5:13); são associados com livros de mágica (Atos 19:19) e ídolos (I Coríntios 10:19-21). Com freqüência causam doença ou deficiência física.

Envolvimento com cartas de tarô, horóscopos ou qualquer outra forma de adivinhações podem dar aos demônios a oportunidade de entrar na vida de um cristão. Tais práticas podem ser inofensivas para a maioria das pessoas, mas Satanás usa as menores chances para obter vantagens sobre as pessoas.

MANIFESTAÇÃO

Com freqüência os demônios preferem se esconder para que possam exercer controle sem oposição. Possuem poderes sobrenaturais (Apocalipse 16:14) e exibem esses poderes através de suas vítimas (Marcos 5:4-5; 9:18-20). Muitas vezes Jesus repreendeu os demônios para livrar pessoas que sofriam por suas possessões.

EXORCISMO

Expulsão de demônios ou exorcismo era uma parte normal do ministério de Jesus, que ordenou a seus seguidores que fizessem o mesmo. Essa ordem nunca cessou e se faz ainda mais importante hoje uma vez que as forças do mal grassam com tanta intensidade no mundo. Os seguintes princípios vêm da prática de Jesus, das Escrituras e da observação e envolvimento pessoais:

1. Jesus se dirigia aos demônios e ordenava-lhes que saíssem (Marcos 1:25; 9:25). Amaldiçoava-os "com uma palavra" (Mateus 8:16). Jesus deu autoridade a seus seguidores para usar Seu nome na expulsão de demônios e usar isto como sinal do discípulo cristão (Marcos 16:17). O nome de Jesus não é uma fórmula mágica e seu uso depende do relacionamento entre o Senhor e a pessoa que usa Seu nome (Atos 19:11-18).

2. Jesus expulsa demônios pelo Espírito de Deus (Mateus 12:28). Deus ungiu Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com poder para curar todos os oprimidos por Satanás (Lucas 4:18-19; Atos 10:38).

3. Jesus ensinou claramente sobre "amarrar o valente" (Mateus 12:29; Marcos 3:27) e sobre ligar e desligar no céu (Mateus 18:18).

4. A oração é arma importante para lidar com demônios. Quando os discípulos perguntaram por que não podiam expulsar um certo tipo de demônio, Jesus respondeu que muitos tipos só poderiam ser dominados com muita oração (Marcos 9:28).

5. Apocalipse 12:11 descreve o poder que "o sangue do Cordeiro" tem sobre Satanás. Os demônios não gostam de ouvir sobre o sangue de Jesus e ficam agitados quando isso é mencionado.

6. Deus equipou o discípulo cristão com arma de defesa em batalha espiritual contra os demônios (Efésios 6:10-17).

7. O Senhor respondeu a Satanás com passagens da Bíblia. A Palavra de Deus nos foi dada como ferramenta de defesa e para atacar Satanás (Efésios 6:17; Hebreus 4:12).

8. Devemos ir contra os demônios do inferno com ajuda dos céus, não com nossos limitados recursos terrenos (Efésios 2:6).

9. Devemos reconhecer que a última vitória já foi ganha por Jesus, que veio para destruir as obras do diabo (I João 3:8) e para destruir o poder de Satanás sobre a morte (Hebreus 2: 14-16). Quando Jesus gritou na cruz "Está consumado", quis dizer que sua obra redentora estava feita. Quando ressuscitou dos mortos, demonstrou poder sobre a morte. Somos vencedores somente se tomamos parte na vitória de Jesus sobre Satanás e seus demônios.

FONTE: ILÚMINA